quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

Jogo do Amor e "Ódio" (Sally Thorne)

Eu nunca pensei que esse dia realmente iria chegar, mas aqui estamos nós. O primeiro livro que eu avalio com apenas uma estrela. Normalmente, sou muito chata com isso. Não me sinto bem dando menos de duas estrelas, afinal, o livro foi o trabalho da vida de alguém. Mas tudo tem limites, não é mesmo? Esse daqui testou meus limites (e minha paciência) e aqui estamos nós. Já vou avisar de primeira que o negócio não ficou muito bom para o lado do livro quando, em menos de cinco páginas, eu já dei de cara com comentários gordofóbicos gritantes na história. Como por exemplo, temos a personagem principal, Lucy, falando que gostaria que seu colega de trabalho, Joshua, fosse "feio e gordo", assim seria mais fácil odiar ele. Além de um apelido que ela dá para seu chefe, que se repete durante o livro todo, que também usa o corpo gordo como ofensa. Como uma mulher gorda que lidou com muitas coisas ao longo dos anos, eu posso afirmar que isso me deixou muito incomodada enquanto eu lia. Inclusive, pensei em abandonar o livro (coisa que não faço deve ter uns seis anos). Eu continuei a leitura apenas para poder reclamar com propriedade e escrever essa resenha como um alerta, afinal, até então eu só via comentários positivos sobre essa história. O que me lembra, a gordofobia não foi o único problema. Vou explicar isso melhor ao longo da resenha, mas o livro como um todo é algo bem problemático. Inicialmente, eu queria ler por conta do filme que vai sair (que já tem até trailer), mas acabou que terminei apenas por questão de honra (e ódio) mesmo. Izabela, você está exagerando. Não, não estou. Aqui vão dois trechos que me tiraram do sério (teve mais, mas acredito que esses já vão deixar bem claro onde quero chegar):

"(...) Joshua deveria ser baixo, gordo, com uma fenda nos lábios (...). Mas ele não é assim. Mais uma prova de que não existe justiça nesse mundo". - Página 10

"Abro a boca e ergo a língua como uma paciente com problemas mentais esperando o medicamento." - Página 27

Dito isso, vamos começar com a sinopse (porque não quero nem gastar meus pequenos divertidamentes escrevendo uma descrição da história): Lucy Hutton e Joshua Templeman se odeiam. Não é desgostar. Não é tolerar. É odiar. E eles não têm nenhum problema em demonstrar esses sentimentos em uma série de manobras ritualísticas passivo-agressivas enquanto permanecem sentados um diante do outro, trabalhando como assistentes executivos de uma editora. Lucy não consegue entender a abordagem apática, rígida e meticulosa que Joshua adota ao realizar seu trabalho. Ele, por sua vez, vive desorientado com as roupas coloridas de Lucy, suas excentricidades e seu jeitinho Poliana de levar a vida. Diante da possibilidade de uma promoção, os dois travam uma guerra de egos e Lucy não recua quando o jogo final pode lhe custar o trabalho de seus sonhos. Enquanto isso, a tensão entre o casal segue fervendo, e agora a moça se dá conta de que talvez não sinta ódio por Joshua. E talvez ele também não sinta ódio por Lucy. Ou talvez esse seja só mais um jogo.

Aqui vai ter reclamações, mas não spoilers, ok? Vamos lá. Tudo para eles é um jogo. Se encarar sem virar o rosto durante o trabalho? Um jogo. Reclamar do que o outro falou com o RH da empresa? Outro jogo. Se odiarem? Mais um jogo. Tudo vira uma comeptição sem sentido com eles. Nada disso é saudável e, por mais que muita gente goste dos livros "enemies to lovers" (inimigos que se apaixonam) esse daqui não é bem por esse caminho, por mais que venda essa vibe, uma vez que o tal do ódio dura menos de cem páginas. Logo eles estão em mais um jogo, levemente doido, em que a tensão entre eles é algo absurdo.

Vamos falar sobre Lucy. Eu já peguei um ranço absurdo dos comentários capacitistas e gordofóbicos dela, mas no final acabei com pena da personagem pelo que a autora fez com ela. A personagem tem como único traço de personalidade amar/odiar seu colega de trabalho. Achei a família dela, a história deles em si, fofa... mas meio que acaba aí tudo sobre ela. Ela não tem amigos, não tem vida social, não se relaciona com as pessoas de forma alguma e tudo que ela respira é o colega de trabalho que ela ama odiar. Agora sobre Josh, ele é o boy lixo que fica disfarçado entre as problemáticas que surgem mais para o lado de Lucy. Ele a provoca o tempo todo, dentro do jogo maníaco deles, e tem uma obsessão por controle da vida dela (coisa que vemos de forma gritante no final... sobre a agenda, não é spoiler, mas quem leu vai pegar onde quero chegar).

Acabei de, literalmente, respirar fundo aqui do outro lado da tela. Essa resenha é um desabafo. Eu queria que tivessem me alertado sobre tudo isso, mas tudo que via (e muito ainda vejo) é puro amor e elogios para esse livro que me deixou chocada. Você tem todo direito do mundo de gostar do livro que for, mas se esse é um dos seus favoritos, gostaria de pedir, de coração, que repense baseado em alguns dos pontos que comentei (principalmente sobre o capacitismo e gordofobia). Afinal, se machuca uma pessoa e/ou um grupo de pessoas, coisa boa não pode ser, né?


jogo do amor e "ódio"
AUTOR(A): sally thorne
EDITORA: universo dos livros
PÁGINAS: 400
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